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Fundamentos do tiro: Me ensinaram realmente o que era fundamental?

Introdução

Todos os dias ouvimos grandes instrutores falarem sobre a importância dos fundamentos para a realização do tiro preciso. “Excelência no Básico” também são palavras de ordem atualmente, quando queremos estimular que os aprendizes (dos mais novos aos mais experientes) dediquem mais tempo ao treinamento dos pilares que compõem um tiro de qualidade. Mesmo com todo esse destaque para os fundamentos, já reparou que as literaturas algumas vezes divergem ao listar quais são eles? Já percebeu que existem fundamentos que praticamente não exercitamos? Eles continuam sendo fundamentais? Como a qualidade dos fundamentos interfere em um confronto armado real?


Fundamentos do tiro preciso.

Antes de tratar sobre as divergências de literaturas, aspectos do tiro de combate e sobre questões do trabalho de fundamento no treinamento de quem porta arma de fogo, melhor listar aqui que fundamentos são esses.

No apanhado geral, temos como fundamentos do tiro preciso:

  • Posição (também chamada de Posição estável, Postura, Posição exterior, base)

  • Empunhadura

  • Alinhamento do sistema de mira com o alvo (também chamado de visada)

  • Pressionamento do gatilho (ou controle do gatilho)

  • Respiração

  • Follow Through (traduzido frequentemente como “Seguimento” do disparo ou literalmente como “Seguir através”).

Agora que já listamos os tais fundamentos é possível então trazer à tona algumas perguntas comuns, e a primeira delas é:


Fundamental para quem?

Pela própria natureza do nome, não deveria parecer razoável estabelecer o nível de importância de um ou outro fundamento do tiro de acordo com a atividade fim pretendida com o treinamento. Fundamentos deveriam ser inegociáveis, pois eles sustentam todo o desenvolvimento da habilidade, seja ela qual for. Entretanto, precisamos conversar sobre como eles serão trabalhados no treinamento, e para isso precisamos sim entender exatamente sobre o ramo do tiro onde pretendemos aplicar esses fundamentos.

Quando alguém está treinando para participar de uma modalidade de tiro esportivo como o tiro com pistola, o insistente treinamento de todos os fundamentos listados acima, em igual importância, é vital para o resultado positivo, uma vez que a precisão deve ser máxima e as variáveis da aplicação são previsíveis. Por outro lado, se você tem como objetivo atirar com pistola para defender a própria vida em ocorrências que, estatisticamente, dificilmente passam dos 5m de distância, os fundamentos de empunhadura e pressionamento do gatilho parecem se destacar e deixar de lado, por exemplo, o fundamento de respiração (Ou alguém já te orientou a fazer o disparo no agressor somente depois de soltar o ar e aproveitar o arco de movimento mínimo para não atrapalhar na precisão do disparo? Acho que não).

Esses dois exemplos são extremos que mostram como os fundamentos podem adquirir níveis diferentes de importância de acordo com a meta ambiental escolhida. Inclusive, é importante notar que a maioria dos autores falam em “Fundamentos para o tiro Preciso”, e não para qualquer tiro. Muitas vezes a meta ambiental da nossa atividade permite menor precisão pelo fato de que demanda muita velocidade de execução da habilidade. É o caso de uma reação armada em curta distância.

Em uma terceira proposta de análise, poderíamos falar sobre a atuação do Atirador Policial de Precisão (Sniper), que é, possivelmente, o melhor exemplo da mistura dos dois extremos já apresentados. Ele pode trabalhar tanto em um ambiente perfeitamente previsível (ocorrência com refém com distância calculada, posto de tiro montado, posição adequada) mas também pode trabalhar em situações com variáveis pouco controláveis (Confronto com assaltantes de banco em distâncias muito variadas, necessidade de fazer o disparo de maneira muito rápida e em posições extremamente desconfortáveis). Esse tipo de profissional precisa trabalhar os fundamentos com enfoques bem diferentes, pois deve ter noção exata do prejuízo da alteração de cada fator e treinar para cumprir sua missão mesmo em situação desfavorável. Ele precisa conhecer os fundamentos em profundidade suficiente para saber inclusive quando deve ignorar um deles.


O que dizem os livros?

A complexidade do tema está ratificada nos livros sobre a atividade do tiro, justamente pelo fato de que a denominação dos fundamentos se altera a depender da referência, suprimindo ou adicionando fatores, cada qual com suas explicações para tal.

Exemplos:

Para FLORES e GOMES (2006) São Fatores fundamentais:

  • Saque e empunhadura;

  • Controle do cano e do gatilho;

  • Visada correta e respiração adequada;

  • Posição de tiro estável;

  • Acionamento do gatilho perfeito.

Para DE SOUZA (2014) os aspectos técnicos mais importantes são:

  • Empunhadura;

  • Visada;

  • Acionamento do Gatilho;

  • Respiração;

  • Postura.

Para VASCONCELOS (2015) os fundamentos são:

  • Posição estável;

  • Pontaria;

  • Controle da respiração;

  • Acionamento do gatilho;

  • Seguimento do tiro.

Para PELLEGRINI e MORAES (2017) são fundamentos do tiro:

  • Base;

  • Empunhadura;

  • Visada;

  • Acionamento do gatilho;

  • Follow Through.

Com esses quatro exemplos já podemos ter uma noção da miscelânea de interpretações nos detalhes, apesar do aspecto geral se manter bem semelhante. Todos relatam cinco fundamentos, falam na importância de como nos posicionamos, utilizamos o aparelho de pontaria e pressionamos o gatilho. Um exclui a questão da respiração (não é por coincidência que o nome do livro é “Tiro de Combate”), bem como apenas os mais recentes citam o conceito de Follow Through como fundamento do tiro, talvez em virtude dos mais recentes intercâmbios técnicos de atiradores brasileiros no exterior.


Discussão antiga

A discussão sobre aplicação de fundamentos de tiro durante um confronto armado (bem como a aplicação no treinamento que prepara para esse confronto) não é nova e as questões polêmicas continuam as mesmas, apesar de novas roupagens em termos de técnica, equipamento e procedimento. A polêmica sobre usar ou não o aparelho de pontaria durante um tiroteio, ou sobre a questão da reação armada utilizando empunhadura simples ou dupla e até mesmo se a arma deve estar na linha da visão ou mais abaixo consta em livros de 50 anos atrás. Nomes como Applegate, Sykes e Jeff Cooper são importantes nessa discussão.

Livro: Shooting do Live. Autores: Fairbairn e Sykes. Ano: 1942.Livro: Kill or Get Killed. Autor: Rex Applegate. Ano: 1976.


Livro: Principles of Personal Defense.

Autor: Jeff Cooper.

Ano: 1989.


Discussão atual

Não é à toa que debates sobre “Tiro indexado”, “Tiro intuitivo”, “Tiro visado”, “Tiro de entrevista” e “Point Shooting” continuam a figurar entre as polêmicas discussões doutrinárias dos ambientes de treinamento. Tem quem afirme que devemos desenvolver a habilidade de utilizar o sistema de mira mesmo em situações de estresse elevado, pois isso garante a precisão e a vitória. Também existe quem entenda que a dinâmica rápida e emocional do confronto armado mostra que é mais proveitoso perder certo nível de precisão para ganhar velocidade, consciência situacional e adotar uma técnica mais alinhada com os efeitos psicológicos e fisiológicos do estresse. É possível ver, ainda, quem entenda que utilizar o sistema de mira no treinamento (principalmente no início do desenvolvimento da habilidade de tiro) é justamente o que melhora a qualidade dos disparos que, sob estresse, não permitem a devida utilização da alça e maça.

Não vim aqui para dizer que quem treina para o tiro de combate vai ignorar esse ou aquele fundamento, apesar de que, ao escolher um ou outro viés doutrinário para a condução do seu treinamento, você pode acabar fazendo isso. Estou tentando apenas dizer que não parece um pecado capital avaliar o nível de pertinência de determinado fundamento e como incluir o mesmo nos exercícios para atingir suas metas ambientais de performance.


Vamos eleger fundamentos campeões?

Antes de ousar propor aqui quais os fundamentos que considero mais importantes (que heresia), me permitam primeiro restringir o contexto para a afirmação. Considero como público alvo da análise o profissional de segurança pública médio, que tem a arma de fogo como ferramenta de trabalho na preservação da vida (própria e de terceiros), que não dispõe de mais do que três horas semanais de treinamento técnico para sua atividade, que não dispõe de mais do que 50 cartuchos para treinamento mensal de tiro (isso já considerando que é ele quem vai pagar por essa munição) e que esse profissional está sujeito mais provavelmente a um confronto em distâncias menores do que 7 metros. Para essa meta ambiental, três fatores são vitais (enquanto fatores que causam os erros mais frequentes na realização do disparo e como áreas importantes para investir durante o treinamento escasso do profissional):

  • Empunhadura

  • Alinhamento da arma com o alvo (através da utilização do aparelho de pontaria mecânico ou da qualidade proprioceptiva dos movimentos de apresentação da arma e engajamento dos alvos).

  • Pressionamento do gatilho

Esse seria um exemplo de utilização prática do princípio de Pareto e da simplicidade tática na questão técnica do treinamento de tiro pelo profissional de segurança pública. Falei apenas da execução do disparo, ignorando propositalmente toda a questão psicológica da decisão de atirar, sua relação com a percepção, mentalidade para o combate e todas as demais questões cognitivas e emocionais, que são vitais no processo de capacitação e no cenário do confronto.


Conclusão

Para finalizar, esclareço que o objetivo desse artigo não é de rivalizar nem desmerecer qualquer posicionamento doutrinário ou orientação técnica de treinamento. Todo processo de capacitação invariavelmente deverá passar pelo treino do fundamento e quanto mais treinamento adequado houver, melhor será a performance apresentada como resultado. Um treinamento planejado, de acordo com a realidade e bem orientado por profissionais referenciados será sempre um diferencial na aprendizagem.




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